Mortos e desaparecidos políticos: a luta por verdade e justiça no Brasil

Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos

     No Brasil, a radiografia dos atingidos pela repressão política durante a ditadura militar (1964-1985) não está concluída. Ainda observamos uma lacuna entre passado e presente marcada pela ocultação dos acontecimentos, a negação ao direito à verdade e à justiça limitando a ação reparadora e impedindo a articulação e transmissão da herança e da memória desses anos de violência. Podemos dizer, porém, que cerca de 50 mil pessoas foram presas somente nos primeiros meses de ditadura; há pelo menos 426 mortos e desaparecidos políticos no Brasil (incluindo 30 no exterior); um número desconhecido de mortos em manifestações públicas; 7.367 indiciados e 10.034 atingidos na fase de inquérito, em 707 processos na Justiça Militar por crimes contra a segurança nacional; quatro condenações à pena de morte; 130 banidos; 4.862 cassados; 6.592 militares atingidos; milhares de exilados; e centenas de camponeses assassinados; e até o momento, 24.560 vítimas de perseguições por motivos políticos foram anistiados [TELES, J. A.:2005]. (…)

Manifestação em Brasília, 17/12/2008.

     Em novembro de 1979, os familiares de mortos e desaparecidos políticos organizaram informações relatando as denúncias sobre os assassinatos e desaparecimentos decorrentes da perseguição política durante a ditadura brasileira (1964-1985), para serem apresentadas no II Congresso pela Anistia, realizado em Salvador (BA). Esse dossiê foi posteriormente ampliado pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos do Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA/RS) e editado pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em 1984. Na ocasião, os familiares homenagearam Teotônio Vilela, que havia sido presidente da Comissão Mista sobre a Anistia no Congresso Nacional, por ter dedicado seus últimos anos de vida à defesa intransigente da anistia aos presos políticos e das liberdades democráticas no país. Nesse documento constam 339 nomes, dos quais 144 são desaparecidos políticos no Brasil e no exterior. (…)

     Na versão revista e ampliada do Dossiê que agora apresentamos estão reunidas as informações coletadas durante as pesquisas, as conversas e a troca de correspondência com parentes, amigos e ex-presos políticos. Passados 30 anos da edição da Lei de Anistia, a soma atinge 396 pessoas no Brasil, sendo 237 mortos e 159 desaparecidos políticos no Brasil. Desde 1996, novas investigações obtiveram informações de mais 69 pessoas. No exterior, há 30 casos, incluindo os mortos em decorrência de sequelas da tortura ou de acidente no exílio. Além disso, há 10 pessoas que morreram antes do golpe de 1964, totalizando 436 nomes. Esse número pode aumentar, pois não foram esgotadas todas as possibilidades de pesquisa e investigação, tais como as realizadas nos arquivos do antigo SNI, hoje parcialmente disponíveis ao público no Arquivo Nacional. Até o momento, não se obteve acesso aos arquivos militares, alguns poucos documentos referentes às mortes e desaparecimentos, principalmente sobre os que ocorreram na Guerrilha do Araguaia, se tornaram públicos de forma extra-oficial.

Manifestação em frente ao antigo DOI-CODI, em 24/08/2008. Foto de Bruno Maricato

     Destaca-se na luta pela apuração das mortes e dos desaparecimentos as informações conseguidas com o depoimento da ex-presa política Inês Etienne Romeu, quando denunciou em 1980 a existência da Casa da Morte, aparato secreto da repressão política localizado em Petrópolis (RJ), testemunhando a passagem e assassinato de diversos presos desaparecidos naquele local.

Fonte: Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil (1964-1985).
 São Paulo, IEVE/Imprensa Oficial, 2009, pp. 21 e 19-20.